GEOMONUMENTOS

O nosso parque Jurássico

Caros subscritores
Reproduzo aqui, para reflexão, um texto da Prof.ª Maria Helena Henriques (Univ. de Coimbra) publicado no jornal PÚBLICO de 7 de Outubro de 1997
relativamente à incúria das autoridades portuguesas no que diz respeito ao nosso parque Jurássico.

José Brilha - jbrilha@dct.uminho.pt (Out/97)


O nosso Parque Jurássico

Maria Helena Henriques*

Portugal possui um património paleontológico que, nalguns casos, atinge relevância internacional. Refiro-me, por exemplo, às falésias do Cabo Mondego, situadas a Norte da Figueira da Foz, onde é possível observar um dos melhores registos dos sedimentos do Jurássico. Em maré de "Expos" e de preocupações políticas com os oceanos, é no mínimo caricato que um local onde é possivel observar testemunhos da vida e da dinâmica sedimentar de um ambiente marinho de idade jurássica ainda não tenha sido objecto de protecção legal. Isto quando a comunidade científica internacional já o declarou, através das instituições próprias, como um local de referência mundial para aquele período da história da Terra.

O processo de classificacao do Cabo Mondego como Monumento Natural arrasta-se há quase vinte anos, sem que nada nem ninguém ponha cobro ao desmantelamento contínuo das falésias que constituem jazigos fósseis de valor incalculável para a reconstituição da vida do passado. Além disso, não é possível impedir a colecta selvagem de fósseis que são sistematicamente levados para fora do país, e que fazem parte do espólio de museus por esse mundo fora, ou que constituem o objecto de estudo de investigadores estrangeiros que, em Portugal, encontram um local privilegiado para pesquisas no âmbito da Paleontologia, sem se sentirem obrigados a integrar-se nos projectos de investigação desenvolvidos pelos portugueses sobre os mesmos temas.

É frequente a apresentação de trabalhos científicos sobre as associações de fósseis registadas em afloramentos do Jurássico português em reuniões da especialidade efectuadas no estrangeiro, protagonizadas por cientistas que recolheram e estudaram o material fóssil sem que o Estado Português, proprietário legitimo desse valioso espólio, tenha qualquer contrapartida na situação. Dada a dificuldade que genericamente os cientistas portugueses têm na divulgação do trabalho que desenvolvem nos foruns internacionais, a sensação que fica é que não vale a pena continuar as suas pesquisas sobre materiais tão importantes, porque nunca chegamos a tempo. Será que merecemos o Jurássico que temos, se são os outros que o estudam, o divulgam e o protagonizam?

Esta situação de "pilhagem científica" de objectos de estudo tão raros como os fósseis, que não estão inventariados nem protegidos por lei, é anacrónica num país europeu. Isso só é possível porque efectivamente o objecto fóssil, testemunho irrepetivel de algo que foi outrora um ser vivo, não é considerado como património nacional. E de todos, de quem o quiser levar ou comercializar, menos nosso. Não existe qualquer legislação sobre esta matéria. Aliás, na escassa legislação portuguesa sobre áreas protegidas, a preocupação com a conservação da Natureza concentra-se exclusivamente sobre objectos biológicos, e aos objectos geológicos, cuja existência é ignorada, resta a figura de Monumento Natural.

O desfasamento que temos em relação à legislação do mesmo teor existente noutros paises europeus e enorme, e a pratica que conhecemos da aplicacao da nossa legislação e pouco recomendável. Protege-se pontualmente um jazigo fóssil, ao sabor de contextos políticos, e não porque tenhamos uma estratégia global de conservação e valorização do nosso património paleontológico. Portugal é rico de geo-recursos culturais, alguns de reconhecido valor supra-nacional, e que estão totalmente desprotegidos do ponto de vista legal. A situação é insustentável, perigosa e de custos incalculáveis. É preciso parar com esta delapidação sistemática de um património que é de todos nós. Estão em causa recursos geológicos, de índole cultural, cuja exposição e conteúdo são particularmente significativos para reconhecer e interpretar os processos geológicos que modelaram o nosso planeta. Constituem recursos não-renováveis, que se apresentam extremamente vulneráveis dado não estarem explicitamente reconhecidos nem na legislação sobre protecção ambiental, nem na legislação sobre exploração de recursos geológicos.

*Professora de paleontologia da Universidade de Coimbra


Re: O nosso parque Jurássico

Caro José Brilha
Gostei muito de poder tido conhecimento desta situação, embora não saiba de que forma esta Associação pode ajudar. Se tiveres alguma sujestão comunica-nos.

Sofia Diniz - Urbe.Defa@mail.telepac.pt (Out/97)
P.S. Se quiseres saber algo mais sobre a Urbe vê a nossa página na net.


Re: O nosso parque Jurássico

Caros colegas
Efectivamente assim vai o nosso (des)património (paleonto)geológico. Gostaria de referir no entanto que deveremos não esquecer que já se conseguiu algo que há uns anos atrás consideraria ser mera ficção. Refiro-me por exemplo, a se ter desviado a CRIL para protecção de uma jazida; refiro-me ao poder governamental ter sido persuadido a comprar uma pedreira para proteger outra.

Tambem será de sublinhar a integração de certas jazidas (e.x. Cacela, que até tem placas de aviso sobre punições a aplicar no caso de recolha de fósseis) em áreas protegidas associadas a parques. Julgo que o que se passa no caso concreto do estratotipo "menino dos olhos" da Helena (com todo o MÉRITO INTERNACIONAL, diga-se) é que existem por detrás poderes económicos fortíssimos, no caso a indústria cimenteira, que bloqueiam completamente, nos bastidores, qualquer iniciativa que se possa avancar. E isto é que precisa de ser dito ALTO E EM BOM SOM. Se a experiência que resulta das lutas e guerras do Prof. Galopim face ao todo poderoso Ministério das Auto-estradas serve de exemplo, penso que o que é preciso é apontar as nossas (melhores) baterias bem alto. FORÇA HELENA....

No caso das jazidas em Parques Naturais ou reservas integrais, não interessa só legislar (penso que nalguns destes casos, alguma legislação atá já existe). É' fundamental dotar estes organismos de força humana (guardas, vigilantes; porque não investigadores ?!) capaz de vigiar e fazer respeitar a protecção de jazidas e/ou outros georrecursos. Porque não elevar o nivel cientifico-cultural dos componentes da GNR (atravás de sessões patrocinadas pelo governo, sob a directiva dos Departamentos de Geologia espalhados pelo País ?. Da minha parte disponibilizo-me desde já para poder colaborar nesta iniciativa) sensibilizando-os para a protecção deste património. Lá diz o ditado: Quem não sabe é como quem não vê (ou protege). Ao fim de um certo tempo talvez podessemos ter aqui algo semelhante ao que se passa na vizinha Espanha, com a Guardia Civil a zelar e confiscar materiais recolhidos de jazidas espanholas.

Saudações paleontogeológicas,
Mário Cachão - mcachao@fc.ul.pt (Out/97)


GNR ----------- Geologia Neo-Repressiva ----------- GNR

Caros assinantes:
Estava a gostar e a apoiar tudo o que o Sr. Mário Cachão escreveu até que a 3/4 do fim comecei a ler coisas de arrepiar os cabelos. O Sr. Mário Cachão, para preservar o nosso património (paleonto)geológico, defende o uso de métodos repressivos só que um pouco mais "jurássicos" do que os usados actualmente.

Isto é, em vez de serem promovidas sessões de divulgação pelas escolas e pelos jovens do nosso país, serem feitas campanhas nacionais através dos grandes meios de comunicação social e principalmente promover e aliciar as populações locais da necessidade de proteger essas zonas, é defendida uma clara política repressiva (a GNR com diplomas em paleontologia numa mão e o cacete na outra) que evidentemente não consegue preservar coisa nenhuma.

É tempo das pessoas entenderem que o problema da preservação do nosso património não está desligado do resto dos nossos problemas como a falta de civismo, a falta de respeito pela vida alheia que se vê nas nossas estradas, etc. Todos este problema passam pelo AUMENTO CULTURAL e pela EDUCAÇÃO CIVICA de todos os portugueses. E para conseguir isso terá que se investir cada vez mais nas escolas e nos jovens do nosso país.

Evidentemente que não sou contra (antes pelo contrário) a elevar o nível científico-cultural dos componentes da GNR. Acho muito bem, só que não apenas ao nivel geológico mas a todos os niveis. Todos nós teríamos a lucrar com isso. Mais, na maior parte dos países dito civilizados os Guardas de reservas não pertencem a nenhuma força para-militar e são geralmente licenciados em especialidades como a Biologia, Geologia, etc.

Já agora quero também referir que se não se motivar as populações dessas zonas a participarem activamente na preservação do nosso património, quaisquer medidas que sejam tomadas pelos nossos burocratas, sentados nos seus gabinetes em Lisboa, estão condenadas ao fracasso. A titulo de exemplo refiro o tumulto que tem havido quanto à pastoricia em zonas protegidas.

Nós geralmente esquecemo-nos de que antes haver o conceito de "área protegida" já as populações utilizavam essas áreas para seu proveito de uma forma racional. Dificilmente as populações locais aceitarão medidas desta natureza e apoiarão no futuro acções que tendam a preservar o nosso património.

Já chega de prosa, mas não podia deixar passar esta em branco.

Luis Guerreiro - guerreiro@expro.pt (Out/97) 


Re: GNR ----------- Geologia Neo-Repressiva ----------- GNR

Carissimos
Óptimo.... a pedrada no charco está a dar resultado. Efectivamente entendo a apreensão de Luis Guerreiro quanto à possivel atitude repressiva por parte de elementos da GNR (ainda para mais com as notícias que têm vindo a lume na comunicação social sobre certos casos, que consideraria aberrantes e não comuns a todos os elementos da GNR, por não querer ser injusto). Devo dizer que não me recordo da Guardia Civil espanhola ter desancado ninguém durante a sua actividade. Nem é efectivamente preciso, numa sociedade civilizada. Quanto ao restante comentário, isto é, sensibilização ao nível das escolas e das populações (e dos alunos universitários), tem todo a razão. Na realidade o nosso grupo tem já alguma experiência nesse sentido, nos últimos anos... ajuda, mas não me parece que chegue. Mais uma acha...

Mário Cachão - mcachao@fc.ul.pt (Out/97) 


GNR - Geologia NÃO repressiva

Caros colegas de lista
É com agrado (tanto mais que de modo imprevisto) que assisto nesta lista à primeira discussão (no bom sentido do termo) de assunto relacionado com a geologia, nomeadamente na perspectiva da preservação do património geológico português. Efectivamente... e naturalmente, também neste aspecto estamos na cauda da Europa..., mas não é mau sinal começar-se a discutir estes assuntos e mesmo registarem-se algumas iniciativas de conservação (principalmente as relacionadas com os Dinossauros).

Cabe aqui notar que tais iniciativas ter-se-ão devido mais a alguma demagogia politica, coincidente com periodos eleitorais, do que, por um lado a genuina discussão do seu valor e interesse científico pelos especialistas, e por outro a real consciencialização do poder politico e das populações. É certamente dever dos especialistas (geólogos, paleontólogos, etc) discutir e documentar cientificamente o interesse da conservação de determinados afloramentos/secções/cortes geológicos e também alertar o poder politico para isso. É necessário contudo ter algum bom senso e não se cair na utopia conservacionista de tudo e de nada e, em certos casos, procurar mesmo alternativas ao dispendio de milhões para a conservação de determinados sítios que embora com interesse, não justificam tal esforço dos pontos de vista cientifico e social; sobretudo se comparados com outros sitios, de que muitas vezes nem se fala (talvez porque não tenham vestigios de Dinossauros), e que se encontram sujeitos a verdadeiras barbaridades.

Na minha opinião, seria mais importante que os candidatos a politico se cultivassem um pouco mais nestes domínios (monumento natural, património geológico, jazigo fóssil, divulgação científica, etc) do que pretendermos resolver o problema pela força bruta [ainda que com aval cientifico ;-)) ] dos Guardas civis, republicanos ou florestais! Por outras palavras, diria que assistiria com muito mais agrado a uma lição do colega Mário Cachão aos Srs Deputados da Assembleia da República Portuguesa... do que aos Srs GNRs. E julgo mesmo que os Senhores candidatos a autarcas não podem deixar perder a oportunidade de mostrar/propagandear aos seus eleitores que as suas câmaras pertencem mesmo a Europa e que são conhecedoras e preocupadas com a natureza através, p.ex., do simples recenseamento e anúncio público dos sitios com mais interesse de conservação (paisagísticos, geológicos, paleontológicos, etc.) das suas autarquias.

Posso dizer, por ter verificado "in loco", que é muito frequente encontrar no estrangeiro (até já mesmo aqui na vizinha Espanha) placas camarárias indicando o alto interesse científico e de conservação junto dos afloramentos geológicos mais interessantes. E que boa maneira de começar a consciencializar os cidadãos para estes assuntos... ainda que a preservação destes locais implique sem dúvida que a GNR, Guardia Civil ou outra força qualquer, esteja atenta e actue sempre que haja infracção.

De outro modo mais vale estar calado, pois qualquer alerta publicitário para a ocorrência de um interessante jazigo fóssil conduz irremediavelmente e a breve prazo à sua devastadora pilhagem (mesmo pelos ditos especialistas). Isto leva-me a colocar aqui uma outra questão: nas actuais circunstâncias, quando levamos 50 ou mais alunos para observar uma importante jazida fossilífera não estamos também a contribuir para que dentro de muito pouco tempo não exista lá nada de interessante?

Um geoabraço
Paulo Legoinha - pal@mail.fct.unl.pt (Out/97)


GNR (cont.)

Caros colegas
Relativamente ao assunto que tem sido discutido nesta lista nos últimos dias, preservação de locais de interesse geológico, gostaria de colocar mais uma questão à vossa consideração. O que é feito das nossas associações científico-profissionais? Sociedade Geoógica de Portugal, Associação Portuguesa de Geólogos, Associação Portuguesa de Professores de Biologia e Geologia, etc. Não deveriam estas organizações (juntamente com os especialistas de cada dominio cientifico) tomar a iniciativa de promover um debate sobre quais os locais a preservar? Sem este levantamento, a resolução de casos pontuais (Pedreira do Galinha, Carenque, etc.) não constitui, certamente, uma solução definitiva e global. Penso que sem uma proposta devidamente fundamentada nunca conseguiremos convencer o poder politico a publicar leis que protejam o nosso património geológico.

Saudações Geológicas
José Brilha - jbrilha@dct.uminho.pt (Out/97)


GNR (II)

Caríssimos colegas
Efectivamente esse é um outro problema. Com GNR ou sem GNR, a inventariação do nosso património paleonto-geológico é fundamental para qualquer iniciativa credivel e coerente. Infelizmente parece que as nossas associações profissionais não têm funcionado muito bem, ultimamente (nem sequer uma páginazinha na INTERNET). Mas aqui a culpa é de todos nós que não nos empenhamos no seu funcionamento. As associações são um conceito vazio se destituido de pessoas, de colegas, apostados no seu funcionamento. É claro que o problema é mais vasto. Como pode ser possivel com a elevada(ississima...) carga horária de aulas, funções administrativas (não remuneradas nem credenciadas, na maioria dos casos) e outras, ainda se dispor de tempo para.... NÃO DÁ, por muita boa vontade que se possa ter. Contudo, muito gostaria de ver surgir uma Associação Portuguesa de Paleontologia cuja primeira (de varias primeiras possiveis) função fosse a de promover a recolha, inventariação, classificação, etc..., do nosso património paleontológico; uma espécie de livro branco, ou qualquer outra cor.... (tudo menos o negro, que esse já existe !-).

Não estou em condições de levar esta ideia avante sózinho mas muito gostaria de colaborar nela.

Um abraco,
Mário Cachão - mcachao@fc.ul.pt (Out/97) 


Cidadania e Património Paleontológico

Bom,
Parece que a discussão sobre o património Geológico/Paleontológico (e o envolvimento da GNR...) já amainou um pouco. É pena, ainda há muito para discutir... Por exemplo: a elevação da cultura G/P (=Geológica/Paleontológia) da população em geral, ponto imprescindível para uma preservação minimamente consciente e participada, passa pela intervenção e pelo empenhamento dos profissionais de Geologia e Paleontologia (e não só, mas aqui refiro-me especificamente a eles). O modo mais evidente de empenhamento é (será?), por exemplo, promovendo as tais aulas para GNR's e Deputados, alertando para os aspectos culturais/científicos das questões G/P para o grande públio, etc., etc., etc. Mas há um outro campo de intervenção que, de tão evidente, se torna invisivel, a intervenção como cidadão, nomeadamente como cidadão professor (professor dos 50 alunos que levamos ao afloramento), cidadão consumidor (consumidor de livros, de filmes, de documentários televisivos, de jornais, etc.), cidadão autárquico (morador local atento a acções camarárias), etc., etc.

Como cidadãos professores, não nos competirá a nós, em primeira mão, alertar e despertar os nossos alunos para as questões da defesa e preservação do património G/P? Fazer-lhe sentir que há algo de importante a preservar e que eles, enquanto estudantes e futuros profissionais (geólogos e professores) estão na primeira linha dessa defesa. Não nos competirá a nós NÃO levar os nossos 50 (ou 150) alunos para locais sensíveis do ponto de vista da preservação do G/P? E, sobretudo, EXPLICAR-LHES por que é que não se vai a tal ou tal jazida ou afloramento, ou por que em determinado afloramento NÃO PODEM martelar? Afinal de contas para fazer um trabalho de Paleontologia ou uma saída de campo de Geologia na faculdade não é necessário ir martelar para o Xisto de Burgess, ou para a Área Protegida da Arriba Fóssil da Costa da Caparica ou para Cacela (sempre são 50, ou 150 pessoas a martelar..., sobretudo se não estiverem devidamente catequizados). Existem outros locais menos sensíveis, igualmente válidos para essa actividades, fora das áreas protegidas.

Por outro lado, como cidadãos consumidores. Quantos de nós (a pergunta e' rectórica, eu penso que TODOS) já se confrontaram com livros de divulgação científica de temática G/P mal traduzidos, com documentários de temas geológicos mal revistos cientificamente (frequentemente por biólogos, sem ofensa), com textos jornalisticos com imprecisões cientifícas, etc. (Os exemplos são inúmeros, desde os documentários do Discovery e da Odisseia da TVCabo que em português (?!) falam de Cretáceo e Amonitas (ou ondas de lava, em vez de escoadas), até às embalagens de cereais do Parque Jurássico com Dinossáurios voadores e outros que tais...). Face a estas situações, quantos de nós tomaram alguma iniciativa sobre o assunto, quantos de nós se deram ao trabalho de escrever umas linhas aos responsáveis por esses artigos de consumo cultural a comunicar-lhes o que pensávamos sobre o assunto?

Penso que não os suficientes. Possivelmente, se o fizessemos mais frequentemente, talvez conseguissemos incomodar alguém ao ponto de no futuro ter mais cuidado com o produto final (uma carta não faz a Primavera, certo, mas 50!!!, divulgadas também, por exemplo, via GeoPor). Ao fim e ao cabo, ao permitir este estado de coisas sem reagir, estamos a dar um tiro no pé, pois estamos a deixar difundir a ideia de que estes temas são uma coisa tão banal e sem regras que podem ser abordados, traduzidos e divulgados de qualquer maneira e por qual quer pessoa (sem preparação para tal, entenda-se), e de que, se assim é, os profissionais de Geologia e Paleontologia sao desnecessários. Além do mais estamos a pactuar a divulgação de uma cultura da ignorância, pois muito gente absorve esses produtos culturais na melhor das boas-fés, sem suspeitar que lhe estão a impingir um produto impróprio para consumo (verificar a data de validade de uma conserva qualquer um faz, verificar a qualidade de uma tradução geológica e denunciar o "gato por lebre" compete-nos a nós).

Bom, a conversa já vai longa (não quero martirizar-vos), por agora (eu) fico por aqui. Contudo, acho que a discussão não devia terminar. Talvez esta seja a altura certa para começar a atirar o barro do património Geológico/Paleontológico à parede institucional (de uma maneira generalizada e integrada - não apenas limitada aos dinossáurios, que entretanto já cumpriram a sua missão como catalizadores da discussão), mas para isso é necessário haver ideias, agitação mental "brainstorming", que apoie esse lançar de "barro".

Cumprimentos geológicos para todos,
Carlos Marques da Silva - Paleo.Carlos@fc.ul.pt (Out/97) 


Re: Cidadania e Património Paleontológico

Tenho vindo a acompanhar, sem intervir, esta discussão. Nós na Urbe não nos dedicamos directamente ao tipo de preocupações que o Carlos Marques da Silva, designadamente, se dedica. No entanto, parece que, se queremos preversar qualquer tipo de património, temos de o tornar interessante, divertido e um elemento de orgulho de todos. Doutro modo, temos de provocar, ou ir provocando, a entrada da preservação desse património na sensibilidade social do povo que é o nosso. Perdem-me a ignorância, alguém me pode dizer se existe esse tipo de património levantado nalgum centro urbano português? E se sim, o que é que ele pode dizer às pessoas que aí habitam sobre as suas origens? Que detalhes divertidos, pitorescos ou curiosos se podem expôr?

Desculpem se estas perguntas forem extemporâneas, mas se uma civilização se mede pela tolerância que desenvolve relativamente aos tolos, mede-se também certamente pela pedagogia que os seus conhecedores desenvolvem junto aos ignorantes.

Rogério Gomes - tjuv0075@mail.telepac.pt (Out/97)

 

PS - Se alguém quiser saber o que é a Urbe, estamos a construir uma página em http://www.terravista.pt/bilene/1138 


Re: Cidadania e Património Paleontológico

Rogério Gomes "URBE.DEFA" <tjuv0075@mail.telepac.pt> escreveu:

>Perdem-me a ignorância, alguém me pode dizer se existe esse tipo de património levantado nalgum centro urbano português?

A preservação das pistas de dinossauros de Carenque e da pedreira do Galinha são exemplos, embora o segundo não seja propriamente em centro urbano. Outro exemplo poderiam ser "as Falésias do Cabo Mondego". Existem outros locais, alguns em centros urbanos, que poderiam merecer a atenção e possivel classificação de património natural ou outra coisa equivalente (no sentido da necessidade de preservação). Nalgumas áreas de reserva natural ou de paisagem protegida foram feitos estudos e existem relatórios com informação geológica/paleontológica (salvo erro).

> E se sim, o que é que ele pode dizer às pessoas que aí habitam sobre as suas origens? Que detalhes divertidos, pitorescos ou curiosos se podem expôr?

Estamos a falar de conjuntos de estratos/camadas geológicas que podem conter fósseis (restos de seres vivos - alguns desaparecidos, outros podendo ainda existir nos nossos dias - que habitaram o nosso planeta em épocas remotas, ou apenas de vestígios da sua actividade biológica (ovos, pegadas, coprólitos - fezes fossilizadas, etc.). Os estratos e fósseis neles contidos, quando estudados cientificamente, permitem ao geólogo a reconstituição da história do nosso planeta. E'  usual utilizarmos a metáfora de que são como páginas do livro da História da Terra. Dado que o processo de fossilização e' extremamente improvável (devido a todos os condicionalismos bióticos (por. ex. depradação, decomposição orgânica) e fisico-quimicos (erosão, dissolução) a ocorrência de fósseis é sempre motivo de grande interesse para os paleontólogos ou até mesmo para simples curiosos. Mesmo as rochas formadas num determinado período da história da Terra não ficam sempre preservadas, grande parte é destruida por erosão ou por outros fenómenos relacionados com a geodinâmica.

É pois, através do estudo de todos estes retalhinhos geológicos que aparecem à superficie da terra (chamados afloramentos geológicos) e das indicações que os fósseis que encerram nos fornecem acerca da idade e do tipo de ambientes em que se formaram as ditas rochas, que podemos ir "reunindo e ordenando" as páginas do grande livro da história geológica do nosso planeta (cerca de 4,6Ma), incluindo: a percepção e conhecimento da evolução da vida na Terra e das relações filogenéticas dos diversos organismos; a evolução do clima terrestre; o conhecimento das paisagens antigas e sua evolução no tempo; a abertura e fecho de oceanos; a formação das cadeias montanhosas, etc.

O Rogério sabia que onde é hoje o Cabo Espichel, outrora passeavam-se dinossáuros? Sabia que a região de Lisboa (há 60 a 70 Ma atrás) esteve sujeita a acção vulcânica? Existem varias chaminés vulcânicas e escoadas basálticas que ilustram bem o inferno dantesco! Sabia que durante o Miocénico (no periodo de tempo entre os 24 e os 10Ma atrás) Lisboa foi várias vezes invadida pelo oceano e ficou submersa, funcionando as serras de Sintra e da Arrábida como ilhas? E sabia que nesses mares habitaram tubarões e baleias? Sabia que o mar chegou perto de Santarém? E que em terra existiam antepassados dos elefantes?

Sabe que actualmente é extremamente difícil observar os primeiros indícios destas trangressões marinhas (sedimentos de idade aquitaniana - 24 a 21Ma) porque lhes puseram o COLOMBO em cima, e noutros sítios existem prédios cujas fundações assentam neles? Ainda relativamente aos fósseis, certas espécies são tão raras, ou então foram encontradas e caracterizadas em Portugal pela primeira vez - tendo por isso nomes com afinidades lusas, ex. Pokorniella lusitanica (ostracodo) - que não é dificil entender o interesse nacional, senão mesmo mundial, em preservar pelo menos um dos sítios da sua ocorrência [Evidentemente que este interesse terá que ser devidamente discutido e documentado cientificamente por especialistas nacionais e estrangeiros].

Existem pois, em Portugal, algumas das tais "páginas" ou "capitulos" ou mesmo apenas "frases" da história do planeta Terra que não podem ser facilmente substituidas por outras de outros locais do mundo... e só por isso não acha que deviam ser preservadas?

>Desculpem se estas perguntas forem extemporâneas, mas se uma civilização se mede pela tolerância que desenvolve relativamente aos tolos, mede-se também certamente pela pedagogia que os seus conhecedores desenvolvem junto aos ignorantes.

Perguntar... não ofende! Oxalá eu tenha ajudado alguma coisinha. Espero também que outros colegas ajudem a suprimir eventuais falhas/lapsos que eu tenha cometido... pois, por mais conhecedores que sejamos (e não será o caso)... isso nada representa relativamente aquilo que falta conhecer.

Paulo Legoinha - pal@mail.fct.unl.pt (Out/97) 


Como é que é?

Exmos Senhores (as),
Embora não tenha rigorosamente nada que ver com o assunto que tem vindo a ser discutido, permitam-me uma pequena correcção ao último mail. É que não pude deixar de constatar numa gralha do "tamanho da história da terra".

Caro Paulo, como é que é possivel terem existido dinossáuros se o planeta só tem cerca de 4,6 Ma? Cerca de 4,6 Ma? Se calhar foram menos. :-)

Miocénico (periodo de tempo entre os 24 e os 10Ma atrás)? O que é isso para uma tão curta história da terra? :-)

Não seriam 4,6Ga ou por outra 4600 Ma. :-)

Temos que ter cuidado não vão outros subscritores, eventualmente menos entendidos nas ciências da terra, ficar com uma noção errada da história do nosso planeta. E que tal começar a chamar aos afloramentos de grandes dimesões tipo maciço de Sintra, maciço de Monchique, etc, de "retalhinhos geológicos". :-0

Cumprimentos
Joaquim Simão - jars@mail.fct.unl.pt (Out/97) 


Re: Como é que é?

Ooops!! Vejam so a diferença que dois zeros fazem! Ainda por cima quando a unidade é o Ma! Mas ainda bem que suprimiste essa minha falha/lapso... é sinal de que nem todos os da lista andam a dormir! ;-))

Pois é colega é assim mesmo! ... não há infaliveis! ou quem anda à chuva molha-se! ou quem vai à guerra dá e leva!

>E que tal comecar a chamar aos afloramentos de grandes dimensões tipo maciço de Sintra, maciço de Monchique, etc, de "retalhinhos geológicos".     :-0

Retalhinhos??? Eu acho melhor RETALHÕES!!! ... mas ainda não fui aos States, pelo que a escala pode estar a precisar de ser aferida!    ;-))

Paulo Legoinha - pal@mail.fct.unl.pt (Out/97) 


Geologia Urbana

Rogério Gomes, URBE.DEFA wrote:

>Perdem-me a ignorância, alguém me pode dizer se existe esse tipo de património levantado nalgum centro urbano português? E se sim, o que é que ele pode dizer às pessoas que aí habitam sobre as suas origens? Que detalhes divertidos, pitorescos ou curiosos se podem expôr?

Pegando nesta pergunta do colega Rogério Gomes e na resposta do colega Paulo Legoinha, tenho a acrescentar que, em Lisboa, como resultado da cooperação entre o Museu Nacional de História Natural e da Câmara Municipal, estão (há já algum tempo) a ser preparados (creio que ainda não foram instalados, não tenho a certeza) séries de painéis ("leitores de paisagem") que irão ser instalados em locais de Lisboa onde afloram "microretalhinhos" ;-) da geologia citadina. Estes leitores de paisagem alertam os viandantes para aspectos geológicos patentes nos respectivos afloramentos: fósseis, transgressões e regressões, utilização económica dos materiais geológicos, tempo geológico, extinções, vulcanismo, etc., etc. (aspectos que o Paulo Legoinha também referiu). Os leitores são dotados de textos e de imagens alusivas ao tema abordado e procuram chamar a atenção do público utente da cidade para aspectos da Geologia, focando, precisamente, para aspectos que, de algum modo, surpreendam o leigo e o cativem para saber mais sobre estas questões (o que vai ao encontro do que o Rogério Gomes sugeria).

GeoCumprimentos a todos, e, como diz o Martin Lockley (o das pegadas de dinossáurio), "Hasta Bronto, amigos..."

Carlos Marques da Silva - Paleo.Carlos@fc.ul.pt (Out/97) 


Re: Geologia Urbana

Agradeço o esclarecimento. Aliás, os esclarecimentos, contando também com o de Joaquim António Simão. Leitores de paisagem são uma boa ideia, parece-me. Então, o que é que se pode fazer mais? Nada? Não me parece. Se há algo que nos une e caracteriza, como portugueses, é que gostamos das nossas paisagens, das nossas raízes, do nosso território - ainda quando contribuímos alegre ou ganaciosamente para o alterar de modo pouco capaz. Não me parece que o espaço da curiosidade acerca da formação da nossa paisagem, das características físicas das terras em que vivemos, se tenha de esgotar aí.

A título de exemplo - distante, é claro -, a Urbe está a fazer roteiros da colina de Lisboa onde se integra o Hospital S. José, o Campo dos Mártires da Pátria, etc. Um roteiro é sobre a vida comercial local, outro sobre as riquezas patrimoniais (o terceiro não me lembro, não participo do projecto, mas dentro em breve ele vai estar resumido na nossa página) dessa área da Cidade. Para além dos aspectos de turismo cultural urbano que pretendemos desenvolver, há aqui uma tentativa de levar às pessoas que ali habitam um pouco mais de conhecimento acerca da sua área, designadamente aos habitantes recentes - sabemos que é uma área urbana que iniciou a sua renovação social.

O tipo de informações a que vocês têm acesso - e capacidade de qualificar com os vossos instrumentos de conhecimento específicos - podia ser utilizado do mesmo modo, para efeitos semelhantes. Por outro lado, não me lembro de ter alguma vez visto um cenário de rua composto duma imagem regredida duma paisagem de Lisboa. Porquê?

Há imensas coisas que se podem fazer para conhecermos melhor a terra em que vivemos e a sua ancestralidade. Temos todos - ou quase todos - o hábito da discrição, o que não ajuda a transmitir para o exterior o que se conhece, a transmiti-lo a quem não sabe. E todavia não seria esse, aparentemente, um dos fins da "construção de sábios" numa sociedade livre? Ou seja - que me perdoem os mais susceptíveis - não teremos todos obrigações sociais advenientes das capacidades que desenvolvemos? O conhecimento que nos é facultado não se decomporá também numa obrigação ética de investir um pouco de tempo e imaginação na divulgação a terceiros, porventura desatentos, desse conhecimento?

Li diversas críticas ao modo como o nosso património é tratado, do vosso ponto de vista, nesta discussão que tenho tido o privilégio de acompanhar. Haverá maior crítica aos tempos de hoje, à sofreguido e motivação com que se tomam determinadas decisões, do que a relativização duma época no contexto do TEMPO?

Costuma dizer-se que, por vezes, algum distanciamento expõe perante nós o ridículo de algumas atitudes próprias, assim como de outros. Esvazia-as do drama, reduz a sua côr, torna-as menos ideais e mais nuas. Creio que o mesmo se passa com as decisões que afectam uma sociedade. A dificuldade e o desafio consiste na exposição distanciada delas na sua contemporaneidade. Todavia, nunca existiram para o efeito tantos instrumentos disponíveis. E por vezes uma questão de vontade.

Rogério Gomes - tjuv0075@mail.telepac.pt (Out/97) 


Ainda os Geomonumentos

Caros subscritores
Ainda a propósito da última troca de mensagens ocorrida aqui na lista do Geopor relativamente à preservação dos Geomonumentos, vem publicado hoje no jornal Público uma discreta notícia sobre o ameaça de erosão pelas águas das chuvas das pegadas de dinossáuros na Pedreira do Galinha (Ourém). O director do Parque Natural das Serras de Aires e Candeeiros (PNSAC), José Alho, refere que as águas das chuvas estão a afectar negativamente as camadas onde afloram as referidas pegadas. Afinal, parece que não basta legislar para garantir a preservação dos Geomonumentos!

Na mesma noticia, é ainda referido que encerram hoje as jornadas técnicas organizadas pelo PNSAC "Geomunumentos, conservação da natureza e desenvolvimento regional". Será que este encontro foi bem divulgado? Não me parece! Não seria conveniente envolver toda a comunidade geológica nacional neste debate? Se alguém tiver acesso às conclusões do referido encontro seria bom que as enviasse para esta lista.

Saudações Geológicas

Jose' Brilha - jbrilha@dct.uminho.pt (Out/97)


Dinoturismo

Caros Colegas,

Achei interessante dar a conhecer uma iniciativa turistica espanhola que encontrei ha' dias na Feira Internacional de Lisboa dedicada ao turismo. Estava a passar pelo pavilhao das Asturias e comecei a retirar a informacao turistica sobre as cidades, os museus, a natureza da regiao e achei piada a um folheto com um dinossauro na capa que tambem guardei. Uma vez em casa
deparei com um folheto que achei espectacular e que vem de encontro a toda a problematica que foi discutida por no's ha' tempos sobre a divulgacao do nosso patrimonio geologico.

Como nao tenho possibilidade de fazer, nem enviar copias para todos passo a descrever. E' um folheto em formato A2 com o titulo  "Jurasico Asturias - La costa de los Dinosaurios". Comeca com generalidades sobre os dinossauros e sobre o Jurassico, depois explica, sempre de modo muito simples como se formam as pegadas, dando ideia dos  seus diferentes tipos e do dinossauro correspondente.
Depois fala sobre o Jurassico das Asturias e suas formacoes com uma coluna litostratigrafica gira, com indicacoes dos  tipos litologicos, fosseis caracteristicos e ambiente sedimentar, etc.

No interior tem uma carta de satelite da regiao, com localizacao dos itinerarios; cada itinerario com um mapa ampliado da zona a explicar como se pode ir e o que se pode ver. Ilustracoes das praias e locais dos afloramento com fotos dos cortes com indicacao esquematica, nao so' dos locais onde se podem observar as pegadas, mas tambem de limites geologicos, falhas, etc. Tudo, a meu ver, muito bem apresentado, didactico e de simples leitura. O folheto foi feito pelo Conselho de Cultura do Principado das Asturias e pela Sociedade Regional de Turismo.

Sera' que alguma vez as nossas Direccoes Regionais de Turismo se interessariam por este tipo de assuntos? Ou sera' que ainda nao foram alertadas para as potencialidades do nosso patrimonio geologico? Nao seria interessante a comunidade geologica participar na elaboracao deste tipo de material informativo?

Claro que estou a partir do pressuposto que ainda nao ha' nada feito do mesmo tipo em Portugal. Caso contrario digam qualquer coisa.

Tambem nao estou a ver, por exemplo, uma familia ir com os filhos a um Posto de Turismo em Sesimbra e a senhora que atende dizer:

- Muito bom dia, deseja visitar o Castelo ou as praias...
Pai: Nao, no's e' mais fosseis, assim dinossauros e parque jurassico.
Sra: Estou a ver, entao tenho aqui um folheto que muito lhe vai agradar,
com diversa informacao...
Pai: E' isso mesmo, como e' que eu vou para la'?
Sra: Esta' aqui um mapa, portanto esta' aqui o Cabo Espichel, vira aqui,
desce ali, cuidado com criancas e as pegadas sao ali.
Pai: Ora muito obrigado. Miudos vamos ver o parque Jurassico.
Miudos: Viva o pai e' o maior!!! :-)

Uma coisa que me fez uma certa confusao, no folheto espanhol, e' que com a informacao tao bem dada, nao terao eles problemas com vandalismo e destruicao do material. Pelas fotos nao me pareceu haver vedacoes. Ou sera' que GNR espanhola tem algum destacamento de PaleoPolicias (em americano PaleoCops!).

Imaginem um local de interesse geologico e, escondido atras de um arbusto, um PaleoCop numa moto tipo enduro e com um martelo de geologo na cintura com um dispositivo que dava descargas electricas.
Um geoturista aproximava-se do afloramento, com um martelo na mao, e PIMBA!
Acto continuo, sai'a logo o PaleoCop de tras do arbusto. VRUMMMMM.
PaleoCop: Alto. Este local esta' protegido por lei, nao pode martelar nem colher amostras de qualquer especie.
Geoturista:Era o que faltava!
PaleoCop:O que^? Veja la' se quer levar com o ElectroGeo-Martelo!
Geoturista:Levar com que^?
PaleoCop: Entao toma la'! TzzzzTzzzzTzzzzz
Geoturista: Pronto Paleocop.
PaleoCop: Escoste ai' a essa bancada de calcario fossilifero que vou revista-lo!
O que e' isto neste bolso? Moldes internos de braquipodes!!!
Tzzzz
PaleoCop: E neste? Um dente de Tyranossauro!!!!!!
TzzzzTzzzzTzzzzz TzzzzTzzzzTzzzzz TzzzzTzzzzTzzzzz TzzzzTzzzzTzzzzz
TzzzzTzzzzTzzzzz
Geoturista: Pronto! Pare! Nao tenho mais nada.
PaleoCop: O que e' isto? Um cubo de pirite!!?? Isto nao e' daqui da regiao.
Geoturista: Pois nao, comprei numa feira de minerais.
PaleoCop: Entao em vez de o multar fico eu com ele.

Colegas! Isto e', logicamente, uma satira para ser lida com algum humor.

Cumprimentos
Joaquim Simao (Jan.98)

PS: ainda em relacao ao humor acho que devo fazer aqui uma pequena observacao sobre a dino-calinada do meu amigo Paulo Legoinha (4,6 Ma). Estava, para quem nao sabe, a brincar com ele e foi ate' com o seu consentimento que fiz a observacao. E' que quem escreve e le^ mails nao ve^ caras e muito menos coracoes e isto por vezes pode ser injusto!


Turismo Geologico em Portugal

Caros Colegas,

A proposito do GeoTurismo e da sua divulgacao em Portugal (no seguimento da mensagem do colega Joaquim Simao):

De facto, ha muito que em Espanha as questoes do patrimonio geologico e paleontologico sao tratadas de um modo abrangente, integrado e profissional. E verdade que eles tem uma comunidade geologica maior e mais activa e ja discutem estes problemas ha mais tempo que nos, mas, possivelmente, estava na altura de no's despertarmos para estas questoes (de um modo participado e construtivo). Esta iniciativa das Asturias (apenas uma das inzmeras coisas interessantes que se fazem e se passam em Espanha neste dominio), divulgada pelo colega Joaquim Simao, e' um exemplo de como as coisas depois de discutidas, reguladas e enquadradas (tambim legalmente, porque em Espanha existe legislacao sobre o assunto), podem ter implicacoes que ultrapassam, em muito, o ambito puramente geologico (ate chegam ao aproveitamento turistico).

A nivel nacional, e respondendo a questao levantada pelo colega, ja foram feitas algumas coisas, mas poucas. Falarei de uma em que estive envolvido: os materiais de divulgacao da Pedreira do Galinha" na Serra de Aire (Fatima-Torres Novas). (Curiosamente, tambem ha um folheto para as pegadas do Cabo Espichel, em Sesimbra, intitulado: Sesimbra, os dinossaurios andaram por aqui ha mais de cem milhoes de anos..., se calhar ate existe no posto de turismo local). Com o objectivo de divulgar a nivel nacional a jazida da Pedreira do Galinha (apos a sua classificacao como Monumento Natural, em 1996, e integracao no Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros) foi realizado um "poster" alusivo 'a jazida, um folheto de divulgacao da pedreia e do seu patrimonio paleontologico e uma pequena brochura sobre pegadas de dinossaurio. Estes materias, em principio, deveriam ter sido distribuidos pelos postos de turismo da regiao, e nao so (se o foram ou nao, nao sei, essa questao transcende as minhas atribuicoes na materia). O folheto de divulgacao ja vai na segunda tiragem de 10.000 exemplares e, paralelamente, fizeram-se versoes em frances e ingles (10.000 exemplares de cada). (P.S. - estes materias foram produzidos com apoios varios: Grupo Paleo do MNHN, Museu Nacional de Historia Natural da Univ. de Lisboa, Quercus, STEA, PNSAC, Programa Ambiente, etc.)

Sera que estes materiais chegaram ate vos? Sera que (apesar dos 20.000 folhetos distribuidos) se conseguiu chegar a toda a gente potencialmente interessada ou a cativar? Se calhar nao! Em suma: e preciso fazer mais e melhor (sempre).

(Para mais informacoes sobre a Pedreira do Galinha e/ou para - tentar - obter estes materiais sugiro que contactem: PNSAC - Parque Nacional das Serras de Aire e Candeeiros; tel. 043-90168; fax: 043-92605).

Por que nao se fizeram mais materias e de outros tipos? Porque somos poucos e nao damos para as encomendas. Alem disso, falo por mim, por muito prazer que me de^  fazer estas coisas, nao sao estes trabalhos que poe o pao (e, ja agora o chourico e o tintol), em cima da minha mesa ao fim do mes..., porque os faco "'a borla", por amor 'a camisola e, ate', em claro detrimento da progressao na  carreira (enfim, faco-o porque quero, nao me entendao mal). Era preferivel estarem a pagar um ordenado a um jovem geologo (nao que eu seja velho...) para fazer estas coisas. Por outro lado, quando, por vezes, se sugerem novas iniciativas, a resposta mais frequente e': falta de verba.

Para que as nossa Direccoes de Turismo (eventualmente) se interessarem pelo assunto e preciso que haja produto para vender. Ora e impossivel vender patrimonio geologico ou paleontologico em bruto. E necessario que quem esteja habilitado para isso (nao os curiosos e os amadores e os faz de tudo para todos, lamento mas e o que eu penso!) descodifique essa informacao e a torne acessivel ao grande publico: crie textos de divulgacao, crie itenerarios de visitas, escolha as imagens, enquadre e acompanhe os visitantes, e etc. (para isso tambem necessitamos de mais geologos encartados, ou vamos dar esses empregos especializados a curiosos? Perdoem o tom "pseudo-agressivo", mas ele resulta, sobretudo, da impessoalidade do texto e, tambem, do facto de eu me entusiasmar - positivamente - com estes temas). Ou seja, como o colega Joaquim Simao sugere (e eu apoio), e preciso que a comunidade geologica se empenhe neste processo.

E, ainda antes de tudo isto, e preciso saber (por exemplo) quais as regras de acesso aos monumentos geologicos. Nao vamos mandar milhares de potenciais geoturistas "'a balda" para os nossos (do pai's!) afloramentos para apanharem fosseis (isto foi so um exemplo, ha outros).

Quanto 'a questao do vandalismo. Vandalismo, infelizmente, ha em todo o lado. A diferenca esta em que em Portugal nada e feito para o evitar e, como, normalmente, desconhecemos outras realidades, pensamos que "la' fora" tambem e assim.  Em Espanha existe legislacao sobre a proteccao do patrimonio paleontologico (notem o detalhe legislativo: nao e geologico em geral, mas sim paleontologico; para outros objectos geologicos ha, tambem,  legislacao propria), noutros paises ate' existem locais onde e' PROIBIDO martelar e colher amostras. Nao vamos colocar o "carro 'a frente dos bois", so depois de os locais estarem devidamente salvaguardados, enquadrados e valorizados (quando for caso disso), e' que a sua divulgacao e exploracao geoturistica (por exemplo) pode e deve deve ser feita (caso contrario, em vez de divulgar o patrimonio estaremos a contribuir para a sua degradacao acelerada). Como, por exemplo (por acaso, creio que o unico), e' feito na Pedreira do Galinha: o local encontra-se vedado (protegido por uma vedacao), a seguranca dos visitantes foi tida em conta (porque e' uma pedreira desactivada), foram colocados leitores de paisagem com informacao, foi estabelecido um percurso uniformizado e criado um pequeno centro de apoio. E' pouco? Certamente que sim!, mas e um comeco.

E agora um pequeno 'a parte. Oh colega Joaquim Simao, por favor, envie mais epissdios do "PaleoCops" que aqui o pessoal adorou (principalmente a parte do TzzzzzTzzzzz...). Isto a brincar a brincar tambem se fala de assuntos serios!

Transcrevo parte do primeiro episodio da serie (que eu espero longa) dos PaleoCops!

"(...)
PaleoCop:Escoste ai' a essa bancada de calcario fossilifero que vou
revista-lo!
O que e' isto neste bolso? Moldes internos de braquipodes!!!
Tzzzz
PaleoCop:E neste? Um dente de Tyranossauro!!!!!!
TzzzzTzzzzTzzzzz TzzzzTzzzzTzzzzz TzzzzTzzzzTzzzzz TzzzzTzzzzTzzzzz
TzzzzTzzzzTzzzzz
Geoturista:Pronto! Pare! Nao tenho mais nada.
(...)"

Mas, a  proposito do dente de Tyrannosaurus: em Espanha as jazidas de vertebrados fosseis estao (por definicao) protegidas por lei e e' ilegal recolher materiais sem autorizacao previa de entidades competentes (normalmente das Autonomicas). E quem for apanhado a faze-lo sem a devida autorizacao vai dentro, e os fosseis sao confiscados, e quem o apanha e a Guardia Civil (os PaleoCops espanhois).

Nao estaria na altura de pensarmos no assunto, a serio, construtivamente, em relacao ao patrimonio geologico nacional? Dai ter sugerido, ha uns "mails" atras, que se discutisse a criacao uma reserva paleontologica nacional (seja la o que isso for, nao ha precedentes, ha que discuti-lo) que abrangesse as ricas arribas litorais da Regiao Oeste (em dinossaurios, ovos, etc...).

Saudacoes geologicas,

Carlos Marques da Silva (Jan/98)


Patrimonio geologico

Caros colegas

No que respeita a preservacao do patrimonio geologico, gostaria apenas de  referir um caso que conheco em Portugal que e da iniciativa da Camara  Municipal de Arouca, e que alguns dos colegas concerteza ja conhecem.

Na Serra da Freita aflora um granodiorito (granodiorito de Castanheira)  com extensao nao superior a 1 quilometro quadrado, que tem a  particularidade de apresentar nodulos de biotite (com dimensoes que podem  variar de 1 a 10 centimetros, aproximadamente) que, tanto quanto eu  conheco, nao existem em mais lugar nenhum na Peninsula Iberica (pelo  menos). Estes nodulos de biotite estao orientados segundo a foliacao  principal, que no centro do corpo e sub-horizontal, o que associado a  meteorizacao e ao facto de haver uma linha de agua que o atravessa,  possibilita a sua desagregacao. As gentes da regiao chamam-lhe PEDRA  PARIDEIRA.

Devo dizer que estes nodulos de biotite sao muito raros e muito bonitos,  e o facto de se desagregarem facilmente levou a que fossem objecto de  "pilhagem" por parte dos visitantes. Para evitar que a "pilhagem" fosse  total, a Camara Municipal de Arouca, ja ha mais de um par de anos, teve a  iniciativa de vedar (com rede) uma pequena porcao do afloramento do  granodiorito. Suponho que esta autarquia tem um folheto sobre a Serra da  Freita, que a promove sob o ponto de vista turistico, e no qual refere a  existencia das PEDRAS PARIDEIRAS.

Saudacoes geologicas

Jorge Medina - jmedina@geo.ua.pt (Jan/98)


Sou habitante da freguesia de Cacela e soube à relativamente pouco da existencia da jazida fossilífera na minha freguesia; após colher informações junto de uma professora de geologia, resolvi visitar a área correspondente à jazida; o cenário que encontrei foi lamentável...
Grande parte dos fósseis encontram-se na ribeira de Cacela; no entanto, próximo da nascente desta ribeira existe um depósito ilegal de entulhos e electrodomésticos, que acabam por ser arrastados pelas águas da ribeira nos períodos de maior pluviosidade. Resultado: esta ribeira, que para além da sua importância paleontológica é também rica em formações calcárias é uma autentica lixeira; ao percorrê-la poderemos facilmente constatar que, no fundo do seu leito, ao invés de vermos os desejados fósseis, encontramos restos de rádios, de tijolos ou de latas de cerveja...
Segundo informações que recolhi junto da nossa associação local de defesa do património, a ADRIP, é frequente o saque de fósseis, nomeadamente por parte de indíviduos de nacionalidade estrangeira, já que esta jazida não se encontra muito conhecida no nosso país. Aliás, à sua divulgação esta subjacente uma certa ambivalência- por um lado poderia contribuir para a sua preservação, por outro o efeito poderia ser totalmente o contrário...
Para além disso, gostava de referir outra situção curiosa... Entre a praia da Manta Rôta e a aldeia piscatória de Cabanas ergue-se uma arriba fóssil, unica na região pelas suas características... o que se verifica é que, na Quinta da Ria, mesmo junto à arriba (que como é arenítica, e não rochosa, é frágil), construíram dois campos de golfe, e está previsto um hotel e um aldeamento de luxo, em pleno Parque Natural. Creio que a situação da minha freguesia é um caso paradigmático do que se verifica um pouco por todo  o país. Que património deixaremos para as gerações vindouras se continuarmos a destruir o que temos? Em verdade vos digo- enquanto as populações não forem informadas e sensibilizadas para situções como esta não veremos a luz ao fundo do túnel...

Frederico Rosa - luisfgrosa@clix.pt (Fev/2004)


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