|
Sedimentologia e estratigrafia do Cenozóico de Trás-os-Montes
oriental (NE Portugal). |
Pereira, D.I. |
Tese de Doutoramento, 1997, Universidade do Minho, pp.341 |
Resumo:
Abstract
Este trabalho tem como objectivo conhecer a cobertura sedimentar
cenozóica de Trás-os-Montes oriental (NE Portugal). Procedeu-se
à caracterização sedimentológica e ao enquadramento geomorfológico
dos depósitos, bem como à sua correlação com unidades conhecidas
em bacias ou depressões mais próximas da área em estudo. A caracterização
sedimentológica foi efectuada com base quer na descrição das litofácies
e outros dados observados em afloramento, quer com base em dados
laboratoriais, como análise granulométrica, exoscopia, minerais
pesados e mineralogia da fracção < 2µm. Objectivos, enquadramento
geológico e geomorfológico, metodologias e estudos anteriores
são descritos no Capítulo I.
Os sedimentos ocorrem em pequenos retalhos, na maioria dos casos
em depressões situadas no contexto dos acidentes tectónicos de
Mirandela e de Bragança-Vilariça-Manteigas, depressões com expressão
geomorfológica actual, ou em depressões preenchidas e posteriormente
regularizadas pela superfície do Planalto Mirandês. A descrição
e caracterização dos sedimentos (Cap. II), o estudo mais detalhado
de alguns aspectos sedimentológicos (Cap. III) e o conhecimento
das unidades descritas em regiões próximas (Cap. IV), permitiu
definir um conjunto de unidades litostratigráficas, bem como as
condições morfo-sedimentogénicas e correlações estratigráficas
apresentadas no Capítulo V e resumidas da seguinte forma:
- A Formação de Vale Álvaro, com uma espessura máxima observada de 23 metros, é constituída
por conglomerados grosseiros, com clastos pouco rolados e pouco
alterados de rochas máficas e ultramáficas dos Maciços de Bragança
e Morais sobre os quais aflora. Os conglomerados são intercalados
por níveis arenosos e margosos imaturos, vermelhos. A fracção < 2µm
é constituída por esmectite ou esmectite+paligorskite. Esta formação
tem origem em leques aluviais confinados a depressões estreitas.
Em Bragança é evidente a sua deposição num bloco subsidente associado
ao desligamento esquerdo NNE-SSW do acidente Bragança-Vilariça-Manteigas
e em associação com movimentos tectónicos que se poderão relacionar
com a fase Pirenaica. Estes derrames terão ocorrido sob condições
de clima de tendência semi-árida, possivelmente durante o Oligocénico.
- A Formação de Bragança, com uma espessura máxima de 80 metros, preenche vales fluviais
encaixados, desenvolvidos como resposta erosiva a impulsos tectónicos
e consequente levantamento relativo das áreas montanhosas a partir
do Tortoniano médio. Um conjunto de depressões intramontanhosas
ter-se-ão individualizado na continuidade destes movimentos, passando
a drenagem a efectuar-se no sentido dessas depressões que vão
sendo preenchidas por sedimentos pouco evoluídos. Na Formação
de Bragança diferenciam-se dois membros. O Membro de Castro (inferior),
com tendência granodecrescente, é constituído por conglomerados
na base, correspondentes a pavimentos de canal, aos quais se seguem
sedimentos areno-conglomeráticos que sugerem um modelo fluvial
entrançado de baixa sinuosidade e com o leito encaixado no substrato;
para o topo predomina a sedimentação fina, com esmectites dominantes
na fracção < 2µm. O Membro de Atalaia (superior) é areno-conglomerático
e corresponde a uma sucessão de episódios de um modelo fluvial
entrançado de baixa sinuosidade com transições momentâneas para
um estilo mais sinuoso. A Formação de Bragança sugere condições
temperadas a quentes, com uma estação particularmente pluviosa.
A caracterização e a correlação com outras unidades, suportam
a hipótese de uma idade Tortoniano superior a Messiniano inferior
para o Membro de Castro e Messiniano superior a Zancliano para
o Membro de Atalaia.
- A Formação de Mirandela é constituída por uma sucessão de conglomerados de matriz arenosa,
intercalados por níveis arenosos e raros lutitos, indicadores
de um regime de alta energia. Tem um carácter predominantemente
quartzoso e caulinítico. Com uma espessura máxima observada de
30 metros, está limitada à depressão de Mirandela, preenche paleovales
estreitos e profundos e deverá relacionar-se com um impulso tectónico
que abriu aquela depressão a um regime exorreico, percursor da
rede actual atlântica. Admite-se que a Formação de Mirandela se
relacione com a ruptura Ibero-Manchega I (3.5 Ma) e com as condições
relativamente quentes e húmidas do Pliocénico superior.
- A Formação de Aveleda é constituída por depósitos avermelhados superficiais. Ocorrem
essencialmente sobre uma superfície aplanada que marca a descontinuidade
com as formações mais antigas e tem maior desenvolvimento na base
de relevos. Predominam as litofácies conglomeráticas, com clastos
subangulosos quartosos e quartzíticos, suportados numa matriz
abundante lutítica, caulinítico-ilítica. Tem origem em fluxos
do tipo debris flow, intercalados por ocasionais fluxos do tipo
mud flow. As características e a correlação com unidades vizinhas,
sugerem que os sedimentos se depositaram numa etapa fini-neogénica,
em ambiente de leque aluvial, em condições áridas ou semi-áridas
quentes, em resposta à fase tectónica Ibero-Manchega II (2.6 Ma).
- A Formação de Sampaio, confinada à depressão da Vilariça, é constituída por sedimentos
predominantemente conglomeráticos, castanhos ou avermelhados.
Os depósitos, de constituição variada ao longo do vale, denunciam
um modelo de leques aluviais dispostos transversalmente à depressão,
em ligação com as principais incisões que se observam actualmente.
Estão dispostos sobre a superfície que suporta os terraços plistocénicos
do Douro situados entre 50 e 30 metros acima do talvegue. Também
a caracterização da fracção < 2µm evidencia semelhanças entre
esta unidade e os terraços do rio Douro. Os dados permitem admitir
uma idade plistocénica para a Formação de Sampaio.
|
Sedimentology and stratigraphy of the Cenozoic in Eastern Trás-os-Montes
(NE Portugal)
Abstract: The objective of this thesis is the analysis of the Cenozoic
sedimentary cover of eastern Trás-os-Montes in north-east Portugal.
This has involved sedimentological characterization and the study
of the geomorphological positioning of the deposits as well as
their correlation with known units in basins or depressions closest
to the area of study. The sedimentological characterization was
based both on the description of lithofacies and other surface
data and also on laboratory data such as granulometric analysis,
quartz sand surfaces textures (SEM), heavy minerals and < 2µm
mineral associations. Objectives, geological and geomorphological
setting, methodologies and previous studies are described in Ch.
1.
The sediments occur in small outcrops; mostly in depressions resulting
from tectonic accidents in Mirandela and Bragança-Vilariça-Manteigas,
depressions currently geomorphologically evident, or in depressions
filled and levelled by the surface of the Miranda do Douro Upland.
The description and characterization of the sediments (Ch. 2),
the more detailed study of certain sedimentological features (Ch.
3) and the knowledge of recorded units in surrounding regions
(Ch. 4), has enabled the definition of a range of lithostratigraphic
units as well as the morfo-sedimentogenic conditions and stratigraphic
correlations outlined in Ch. 5 with the following conclusions:
- The Vale Álvaro Formation, with a maximum recorded thickness of 23 meters, is formed of
coarse conglomerates, with barely altered and rounded clasts of
mafic and ultramafic rocks from the Massifs of Bragança and Morais
over which they crop out. The conglomerates are intercalated with
red sand layers and immature marl. The <2µm mineral association
is composed of smectite and smectite+palygorskite. This formation
is originated in alluvial fans confined to narrow depressions.
In Bragança, its deposition is evident in a subsident block associated
with the leftward NNE-SSW strike fault caused by the Bragança-Vilariça-Manteigas
accident in conjunction with tectonic movements which could be
related to the Pyrenean phase. These formations occurred under
semi-arid climatic conditions, possibly during the Oligocene.
- The Bragança Formation, with a maximum thickness of 80 meters, fills incised-valleys
and developed as an erosive response to tectonic impulses and
the subsequent rise relative to the mountainous areas dating from
the middle Tortonian. A series of intramountainous depressions
were formed as a result of these movements, with drainage occurring
in the direction of these depressions which were filled with immature
sediments. Within the Bragança Formation, two members can be distinguished.
The lower Castro Member, fining-upward, is formed by conglomerates
at the base which correspond to the channel lags, below gravel-sandy
sediments which suggest a fluvial braided model with low sinuosity
and incised-valleys. Towards the top, fine sediment predominates,
with dominant smectites. The upper Atalaia Member has a gravel-sand
composition and corresponds to a succession of episodes in a fluvial
braided model with low sinuosity and with momentary transitions
to a more sinuous style. The Bragança Formation suggests temperate
to warm conditions with one particularly rainy season. Characterization
and correlation with other units support the hypothesis of an
upper Tortonian to lower Messinian age for the Castro Member and
upper Messinian to Zanclean for the Atalaia Member.
- The Mirandela Formation is formed of a succession of conglomerates with a sandy matrix,
intercalated with sand layers and rare lutites, indicators of
a high energy regime. It has a predominantly quartzose and kaolinitic
character. With a maximum recorded thickness of 30 meters, it
is limited to the Mirandela depression, fills narrow, deep paleovalleys
and should be related to a tectonic impulse which opened up that
depression to an exorheic regime, precursor of the current Atlantic
drainage pattern. It could be argued that the Mirandela Formation
is related to the Ibero-Manchega I phase (3.5 Ma) and the relatively
hot and humid conditions of the Late Pliocene.
- The Aveleda Formation is formed of superficial reddish deposits. They occur essentially
over a level surface which marks a discontinuity with the older
formations. They develop to a greater extent at the base of relieves.
Conglomeratic lithofacies predominate, with sub-angular quartzose
clasts, supported by a predominant mud, kaolinitic-illitic matrix.
They originate in debris flow, intercalated with occasional mud
flow. Characteristics and correlation with neighbouring units
suggest that the sediments were deposited in response to the Ibero-Manchega
II (2.6 Ma) tectonic phase, in an alluvial fan environment, in
hot arid or semi-arid conditions.
- The Sampaio Formation, limited to the Vilariça depression, is formed of predominantly
reddish or brown conglomeratic sediments. These deposits, which
are of varied composition throughout the valley, reveal a model
of alluvial fans perpendicular to the depression. These are connected
to the main incisions which can currently be observed and are
set out over the surface that supports the plistocenic Douro river
terraces. The terraces lie between 50 and 30 meters above the
thalweg. The characterization of the < 2µm mineral association
also shows evidence of similarities between this unit and the
Douro terraces. The data suggests the Pleistocene period for the
Sampaio Formation.
|
índice
|